A quebra da linearidade conhecida também por interconectividade remete a obras clássicas, sobretudo do surrealista Reymond Queneau e do autor do século XVII, Cervantes. O primeiro buscou uma escrita aleatória e aberta à escolha do leitor criando uma possibilidade variante entre as partes, o que caracteriza a multiplicidade e a multilinearidade de percursos do hipertexto. Já Cervantes explorou em sua obra Dom Casmurro a divisão em capítulos (fragmentação), marcados por subtítulos, prólogos, linhas de apoio, sumários, dedicatórias e recursos que Gérard Genette denominou de paratextos, recursos que hoje são potencializados e incorporados pelo hipertexto.
Os paratextos já orientavam a mapear a leitura por tópicos e o deslocamento do centro do texto para as margens, característica que também marca a linguagem hipertextual: o descentramento. A vasta rede de histórias interpoladas é a prova que romancistas nunca se limitaram a um modelo linear de principio – meio – fim e criaram formas elásticas de tornar mais claras suas narrativas fora de um contexto aristotélico, como a velha narrativa de Dom Quixote.
A nova forma de escrita, ao qual o processo hipertextual de escrita e leitura não se reduz somente aos aparelhos eletrônicos, remete a uma pilhagem do velho sobre o novo. Características atribuídas ao hipertexto encontram-se dispersas ao longo da tradição literária de forma não determinada a períodos datados, mas muitas vezes reunidas em uma só obra como é o caso do romance enciclopédia “O dicionário de Kazar”, na qual é possível atribuir um dialogo entre o velho e o novo, a construção e desconstrução da narrativa. Esse olhar “hipertextual” traz a tona algumas proposições teóricas sobre o texto e permite observar como o novo processo emerge de um passado agora “rejuvenescido”.
Contudo, a linguagem construída ao longo da história literária propôs uma alternativa de interação em um ambiente virtual onde uma informação de referência pode ser pesquisada em apenas um clique em um verbete também conhecido como hiperlink. Hoje, na mídia impressa, capas de revistas e jornais funcionam como um menu das homepages.Índices, subtítulos, gráficos e linhas de apoio que permitem as diversas entradas e saídas de texto, sempre fizeram parte da arquitetura da informação em publicações publicitárias periódicas e jornalísticas, servindo de modelo para as páginas de entradas (front pages). Estes trazem de forma implícita o principio do percurso que caracteriza a literatura hipertextual adotado para a web.
João Marcos Russo Ferreira
Comunicação e Multimeios – PUC SP
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