Diego Silva de Avila
06007198
Raquel Wandelli, em Leituras do Hipertexto, parte da idéia de que todos os nossos gestos foram ensaiados, ou seja, de que são os acontecimentos do passado que estruturam o presente.
Sabe-se que é da recriação que emerge o novo, o passado, portanto, é a única matéria prima do presente e, por isso, sua reutilização é uma constante.
Tendo em vista de que nada parte do zero, percebe-se que “as teorias sobre o hipertexto constituídas nas últimas décadas nascem como tribulárias e corolárias das reflexões estruturalistas e pós-estruturalistas sobre o texto que se vinham acumulando e sedimentando no final do último século” (WANDELLI, 2003: 23).
Para a autora, a noção de hipertexto está em pleno processo de construção e, por isso, não se pode classificá-la aqui ou ali. O hipertexto é hoje mais uma forma de escrita do que um conceito fechado.
Hipertexto seria, a priori, uma teoria que converge muitas outras, além, é claro, de uma prototeoria – uma teoria em construção. Partindo de duas idéias, do aparato hipertextual – computador – e de um processo hipertextual de escrita, ou seja, uma tecnologia e uma técnica, que não necessariamente precisam uma da outra para se realizarem como hipertexto.
Lembrando da idéia de que a produção do novo se dá a partir de uma resignificação do velho, surge uma dúvida, “existe um objeto específico a que chamamos hipertexto ou uma forma hipertextual de leitura?” (WANDELLI, 2003: 24).
Assim, não se sabe se o hipertexto incorporou velhas teorias ou criou novas formas de leitura – pessoalmente, acreditamos que as duas questões podem ser respondidas afirmativamente, pois o processo hipertextual acontece de forma antropofágica, com incorporação e resignificação de teorias.
As principais características do processo hipertextual são: a escrita em teia, a conexão, a quebra de linearidade e a variedade de recursos gráficos que, para os estudantes e teóricos da área não se fazem necessárias maiores explicações, basta nos atermos a idéia de que esses elementos são resultados uns dos outros, assim como o próprio processo do hipertexto
Mais adiante perceberemos que nenhuma, mas realmente nenhuma, dessas características surgem com o computador. Com muitos exemplos a autora comprova que as características do hipertexto são apenas revisitas tecnológicas a conceitos antes formulados analogicamente, como Dom Quixote, que fragmentava a história com paratextos, que descentralizavam a leitura, ou os trabalhos de James joyce (1922), Julio cortazar (1966) e Italo calvino (1976)
Pode-se pensar que a função do hipertexto é a de, com seus recursos, trazer consciência de volta a leitura, pois quando nos acostumamos com uma técnica, tendemos a faze-la inconscientemente.
Sendo assim, a autora conclui que não existem datas ou cronologias para o processo hipertextual, pois este foi inserido em varias comunidades separadas pelo tempo e pelo espaço e é, por isso, um conjunto de muitos elementos em processo de organização.
DA OBRA CANONICA AO HIPERTEXTO
“Tout text se construit comme mosaic de citation”
(Kristeva apud Wandelli, 2003: 28)
Dentro da “teoria” do hipertexto, o texto se tornaria um processo e não um produto. Ou seja, o texto é um estado e é sempre aberto a mudança, a novas significações, ao contrário daquela velha visão de texto, que dizia que o mesmo estava pronto e acabado.
O leitor agora é visto, com das teorias da recepção é ele que atribui sentido, e é o produtor do significado. Sem ele não existe nem texto, muito menos hipertexto.
Genette define hipertexto como o objeto que surge da relação que este manteve com outro, a partir de transformação, imitação, paródia ou pastiche
A nossa forma de pensar e ver sofreu um processo de desdogmatização, e isso se deu por alguns motivos, destacando-se:
• A teoria da intertextualidade – coexistência de obras
• A descentralização do escritor ou a fragmentação do autor
• A idéia de texto como processo e não produto
• A teoria da recepção e a idéia do leitor produtor de significados
Deleuze e Guatarri introduzem o conceito do Rizoma, contrario a idéia de hierarquia, pois de um centro surgem ramificações para todos os lados e qualquer um desses lados podem se tornar um outro centro que, por sua vez, se ramifica.
“Rizoma é um crescimento orgânico caótico, interceptado e ramificado pelo meio, de forma que todos os extremos, funcionando como pontos de entrada, mantém entre si uma comunicação em rede” (WANDELLI, 2003: 31)
A teoria do hipertexto nasce dentro do cenário da complexidade que vive-se desde meados do século XX e, por isso, as conexões podem ser inseridas nas teorias.
O memex, idéia-pai do google, foi criado para organizar as técnicas de armazenamento humanas, onde o seu criador, Vannevar bush, partiu do princípio de que a mente opera por associações. Existiriam, assim, trilhas de interesse, que se cruzariam ou se distanciariam de acordo com a interface das coisas organizadas. Se o pensamento é associativo, ler e escrever também deveriam ser.
Assim, o hipertexto seria então um texto que vai alem do texto. “Na verdade, o hipertexto redefine o livro de um modo que incorpora tanto a forma linear quanto a não-linear. Todo texto, por mais fragmentado que seja, retém sempre algum grau de seqüencialidade, alguma dimensão mínima ou granularidade” (WANDELLI, 2003: 35). Pois existe ordem no caos e vice-versa. O que não existe mais, é uma previsibilidade.
“À medida que passa a euforia da novidade, começa-se a perceber que o hipertexto não se restringe a um aparato eletrônico, mas a um processo de escrita reticulada” (WANDELLI, 2003: 37).
O impresso também é resignificado, conforme proposto por McLuhan em o meio é a mensagem, pois toda nova mídia realoca as anteriores.
A forma de escrever mudou e não técnicas e tecnologias novas apareceram misteriosamente. Para a autora, a técnica não determina o modo de escrita.
Por fim, Levy define que o hipertexto “é um conjunto de nós ligados por conexões […] os itens de informação não são ligados linearmente, como em uma corda com nós, mas cada um deles, ou a maioria, estende suas conexões em estrela, de modo reticular. Navegar em um hipertexto significa desenhar um percurso em uma rede […]” (Levy, apud Wandelli, 2003: 39)
Logo, a hipertextualidade é uma potência – que pode ou não ser ativada. E, se ativada, uma base de dados cria o rumo que pode ser percorrido de formas diversas, dependendo de seu próprio grau de complexidade. E é “na ausência de um todo aparente e pré-organizado, o leitor vê-se obrigado a arregaçar as mangas e traçar seu caminho em uma floresta escura” (WANDELLI, 2003: 41).
WANDELLI, Raquel. Leituras do hipertexto: viagem ao dicionário kazar. Florianópolis, UFSC: 2003.
terça-feira, 30 de junho de 2009
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